Índice
Introdução
Com um mercado marcado pela dependência do preço das commodities e volatilidade no preço de venda, a suinocultura da atualidade exige que o produtor tenha absoluto controle sobre sua produção para que bons resultados apareçam. Por suas peculiaridades, a suinocultura exige escolhas racionais no que diz respeito à utilização eficiente dos fatores de produção, uma vez que as escolhas adotadas na execução da atividade impactam o custo total, que por sua vez, irá impactar diretamente os resultados econômicos. Neste sentido, a gestão rural é de fundamental importância para a identificação dos principais pontos de estrangulamento no sistema produtivo, com o objetivo de levantar informações capazes de criar intervenções que aumentem a eficiência produtiva e econômica do sistema. Dessa forma, ressalta-se a importância do conhecimento, gestão e controle dos custos de produção para maximização dos resultados e embasamento à tomada de decisão estratégica.
Um dos gargalos encontrados na suinocultura brasileira é que parte dos produtores ainda se mostram resistentes quanto à adoção de métodos que estimem os custos de produção, visto que tais análises são complexas e trabalhosas e requerem uma anotação minuciosa dos dados da propriedade. Dessa forma, muitas vezes, devido a controles internos deficientes as granjas são gerenciadas de forma empírica, não sendo possível obter o custo do suíno a ser comercializado. Existe ainda outro fator que dificulta a realização de uma análise dos custos em atividades pecuárias: a falta de um protocolo padrão, previamente definido, para o cálculo dos custos de produção. Neste sentido, o presente estudo foi motivado pela necessidade do desenvolvimento de uma ferramenta que ofereça ao suinocultor um método padrão para controlar seus custos de produção e consequentemente, ofereça as informações necessárias para nortear a tomada de decisão estratégica dentro da porteira, buscando a maximização do lucro.
Considerado o exposto, foi desenvolvido o projeto de pesquisa que teve por objetivo: i) o desenvolvimento de um modelo matemático para o cálculo dos custos de produção de suínos e análise de viabilidade econômica da atividade; e ii) a elaboração do Índice de Custo de Produção do Suíno Paulista (ICPS).
Metodologia adotada
O esquema de alocação dos custos adotados foi guiado por algumas premissas, visando objetividade, para permitir o entendimento, a comparação e a tomada de decisão, sem negligenciar outros itens efetivamente necessários. A primeira delas, foi desenvolver um modelo de cálculo seguindo os preceitos da Teoria Econômica Neoclássica dos Custos. O esquema de alocação de todos os itens de custos utilizados consta no quadro a seguir:
A – CUSTOS VARIÁVEIS
I – DESPESAS DE CUSTEIO DOS ANIMAIS
1. Alimentação
2. Despesas veterinárias
3. Despesas com manejos reprodutivos
4. Despesas com bens de consumo
Subtotal custeio da criação
5. Despesas com transportes, carregamentos e seguros
II – OUTRAS DESPESAS VARIÁVIES
1. Impostos (ICMS, entre outros)
2. GTA
3. Funrural
4. Outras taxas variáveis
B – CUSTOS FIXOS OPERACIONAIS
III – MÃO DE OBRA
1. Despesas com mão de obra fixa
2. Despesas com mão de obra temporária
IV – TELEFONIA, INTERNET, ENERGIA E COMBUSTÍVEIS
1. Despesas com serviço de telefonia e internet
2. Despesas com energia elétrica
3. Despesas com combustíveis
V – DEPRECIAÇÕES
1. Benfeitorias e instalações
2. Máquinas e implementos
3. Ativos biológicos
VI – MANUTENÇÕES E CONSERVAÇÃO
1. Manutenção das instalações
2. Manutenção de máquinas e implementos
VII – OUTRAS DESPESAS FIXAS
1. Impostos (ITR, entre outros)
2. Taxas (Sindicato, Associação, entre outros)
3. Outras taxas fixas
C – CUSTO OPERACIONAL (A+B)
D – CUSTO DE REMUNERAÇÃO DO CAPITAL E DA TERRA
VIII – CUSTO DE OPORTUNIDADE DO CAPITAL E DA TERRA
1. Remuneração sobre o capital imobilizado
2. Remuneração sobre o capital de giro
3. Custo de oportunidade do arrendamento da terra
E – CUSTO TOTAL (C + D)
Quadro 1 – Esquema de alocação dos custos para sistema de produção de suínos. Fonte: Dados da pesquisa.
Optou-se pelo agrupamento em custos variáveis, custos fixos operacionais e custos de oportunidade sobre o capital e a terra, pois enquadra-se na primeira premissa, e, além disso, acredita-se que tal alocação seja de fácil entendimento para os produtores. A alocação segregada dos custos de oportunidade sobre o capital e a terra se deu com o objetivo de deixar claro para o produtor que, o custo de oportunidade é um custo da atividade suinícola, no entanto, em caso de fatores próprios, é uma receita ao produtor. Dessa forma, é possível visualizar no cotidiano da granja o que de fato representa o custeio da criação e itens necessários para operar a atividade (Item C), bem como o que representa a remuneração do suinocultor pelo uso do capital, seja ele imobilizado ou não (Item D).
Para atender o segundo objetivo deste estudo, foi elaborado o Índice de Custo de Produção do Suíno Paulista (ICPS), o qual tem sido divulgado mensalmente à cadeia produtiva de suínos. Para gerar os resultados de custos, foram delineadas propriedades representativas a partir de levantamentos feitos a campo no estado de São Paulo. Associou-se os dados coletados a campo à experiência dos pesquisadores, bem como dados da literatura e criaram-se duas granjas modelos, que representassem a realidade das granjas existentes no estado de São Paulo – o que se conhece como propriedade representativa.
As propriedades representativas propostas foram definidas nos seguintes termos: ICPS500 referente a granjas com até 500 matrizes suínas alojadas; e ICPS2000 referente a granjas com 501 a 2000 matrizes alojadas. Esta linha de corte foi aplicada em função das características dos sistemas produtivos do estado de São Paulo, uma vez que, segundo dados do IBGE (2019), 98,2% dos municípios paulistas detentores de rebanhos suínos (n=556) possuem menos de 2000 matrizes alojadas, o que demonstra a expressividade do indicador e sua adequação ao cenário da suinocultura do estado. A mesma linha de corte é utilizada para categorizar as granjas paulistas, pela APCS, sendo então validada pelos produtores e técnicos do setor em reunião realizada.
Após definição das linhas de corte e categorização das propriedades representativas, definiu-se então os principais parâmetros organizacionais e produtivos das granjas. Os parâmetros referenciais propostos nas unidades representativas foram baseados nos dados do levantamento a campo, bem como nos contatos e validações com técnicos e especialistas do setor, além de contar com a experiência prévia dos pesquisadores. A descrição dos principais parâmetros zootécnicos que compõem as propriedades representativas para a elaboração dos indicadores de custos pode ser observada na tabela a seguir.
A partir da definição das propriedades representativas foi possível calcular os custos de produção de suínos e compará-los, ao utilizar o modelo de cálculo adotado. A seguir, comparou-se os custos de produção do cevado no estado de São Paulo entre os meses de dezembro de 2021 e janeiro de 2022.
Como podemos observar, no mês de janeiro foi detectado um aumento dos custos de produção do cevado no estado de São Paulo em comparação ao mês anterior, dezembro de 2021. Para as granjas de ciclo completo representativas ICPS500 e ICPS2000 este aumento no custo foi de 5,41% e 6,03%, respectivamente.
Para as granjas paulistas com até 500 matrizes alojadas (ICPS500) os custos operacionais (COP) representaram cerca de 88% do custo total (CT), o que equivale a R$ 8,15, em R$/kg de cevado produzido. Já para as granjas com 501 a 2000 matrizes alojadas (ICPS2000), os custos operacionais representaram 87,6% do CT, o que equivale a R$ 7,09. O COP nada mais é do que a somatória dos custos variáveis (CV) e fixos operacionais (CFOP) de produção. Enquanto o CT, é a somatória dos COP aos custos de oportunidade sobre o uso do capital e da terra (CO). A participação do CV, CFOP e CO no custo total pode ser observada na Tabela 3, a seguir.
Nas granjas independentes o custo com alimentação se mostra como o item de maior impacto sob o custo total (CT) de produção, representando 63,7% para a ICPS500 e 67,3% para a ICPS2000. Fora detectado pela nossa equipe o aumento no preço dos insumos alimentares utilizados na formulação das dietas dos animais, o que acarretou a elevação do custo médio da ração nas granjas representativas. Dentre os itens de maior impacto, pode-se observar um aumento de 15,3% no preço do milho grão e de 26,4% para o farelo de soja, em comparação ao mês anterior. Outros fatores como reajustes salariais e aumento dos preços de ativos do inventário físico e, consequentemente, elevação dos custos com depreciações e manutenções também impactaram no custo total neste mês de janeiro.
Na granja representativa ICPS500 observou-se neste mês de janeiro o maior custo, desde o início do acompanhamento do mercado do suíno paulista. Na figura 1, a seguir, é possível observar o custo de produção do cevado, em reais por quilograma produzido, para as duas granjas representativas no ano de 2021 e em janeiro de 2022. Um dos fatores que justificam custos inferiores para a ICPS2000 em comparação a granjas menores, representadas pela ICPS500, está na exploração dos ganhos em escala, ou seja, na maior diluição dos custos fixos, observada em granjas com maior nível de produção.
No comparativo entre janeiro de 2021 e janeiro de 2022, o Índice de Custo de Produção do Suíno Paulista apresenta uma variação de +8,12 pontos percentuais para o ICPS500 e +2,02 pontos percentuais para o ICPS2000. O comportamento do ICPS mensal até o momento, pode ser observado na Figura 2, a seguir.
Diante de tal cenário, é possível analisar como foi o ano de 2021 para a suinocultura paulista, bem como analisar o que se pode esperar de 2022. Durante o ano de 2021 tivemos dois fatores muito positivos para a suinocultura nacional: o aumento considerável do consumo per capita da população, bem como o aumento das exportações que alcançaram novos recordes. Os embarques de carne suína in natura totalizaram 1,15 milhões de toneladas e superaram em 12,74% os volumes exportados no ano anterior, 2020.
No entanto, se por um lado, o mercado de exportação se comporta de forma positiva, por outro, o mercado doméstico tem se mostrado hostil e preocupado suinocultores e associações. Sinais de superoferta derrubaram os preços do suíno em todo o Brasil, comportamento que vem sendo observado desde a segunda semana de dezembro de 2021.
Esta queda de preços é apontada por especialistas como resultado do elevado crescimento da produção de suínos dos últimos anos, coincidindo com uma crise econômica em que a inflação nos dois dígitos, o PIB estagnado e o desemprego corroem o poder aquisitivo do consumidor brasileiro. Além disso, tradicionalmente, inícios de ano são de retração de demanda por carne suína no mercado doméstico, o que agrava o desequilíbrio entre oferta e procura, o que pressiona ainda mais para baixo os preços pagos aos suinocultores. Em contrapartida, observa-se a elevação nos custos de produção, e obviamente, uma conta que não fecha.
Sabe-se que o sucesso ou insucesso do ciclo produtivo é determinado, em boa parte, pelo trinômio: preço do milho, preço do farelo de soja e valor pago pelo suíno. E, a dependência do preço das commodities deixa os produtores extremamente vulneráveis. Mas o que fazer porteira adentro afim de minimizar os efeitos deletérios deste cenário? A resposta é simples: GESTÃO.
Momentos como este reforçam a necessidade de uma gestão eficiente, uma vez que tanto o preço das commodities, quanto o preço pago pelo quilo de animal produzido são fatores externos à produção e não podem ser controlados pelo suinocultor. Dessa forma, manter a produtividade a custos de produção que não comprometam a viabilidade econômica da criação se mostra um grande desafio e para contorná-lo, é necessário aplicar métodos eficientes de gestão da criação. Neste sentido, é crucial usar de maneira estratégica os fatores de produção: terra, trabalho e capital. Para tal, faz-se necessário gerenciar e controlar os custos de produção. A inserção da análise de custos é imprescindível para a expansão da competitividade da atividade, visto que o conhecimento e a gestão dos custos de produção auxiliam na tomada de decisão racional dentro da porteira.
Considerações Finais
O desenvolvimento do modelo de cálculo do custo de produção a partir de conceitos da Teoria Econômica possibilita o cálculo e a comparação dos custos de produção envolvidos nas propriedades suinícolas delineadas neste estudo. Com os custos calculados para diferentes categorias de sistemas de produção de suínos, o trabalho fornece subsídios para a compreensão dos processos produtivos, para diagnósticos sobre a eficiência e competitividade da suinocultura no estado e para a identificação de gargalos enfrentados pela atividade.
O ICPS é uma ferramenta importante para o mercado e a cadeia agroecoindustrial suinícola, uma vez que apresenta potencial para colaborar com a organização do setor. O indicador auxilia na transparência entre produtores e indústria frigorífica, atuando como um balizador de preços, uma vez que as informações geradas oferecem condições de barganha aos produtores, que terão informações como subsídios para negociar preços de comercialização do cevado que cubram os custos de produção de suínos no Estado de São Paulo. Além disso, com uma nova edição todo mês, o ICPS traz informações acerca do cenário da suinocultura paulista, bem como do comportamento dos custos de produção, permitindo aos pesquisadores o acompanhamento constante dos preços de todos os insumos e produtos utilizados na atividade. Isso facilita a análise das variações de preços na rentabilidade do setor.
Caso queira receber mensalmente o indicador de custos de produção de suínos, solicite gratuitamente em https://materiais.agromove.com.br/informativo-lae-suino-paulista.
O projeto de pesquisa foi desenvolvido durante o mestrado da autora, MSc. Laya Kannan Silva Alves, intitulado: “Desenvolvimento de modelo de cálculo e de indicador de custos de produção de suínos” , junto ao Programa de Pós-Graduação em Nutrição e Produção Animal (FMVZ/USP). Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/10/10135/tde-19072021-122134/publico/Laya_Kannan_Silva_Alves_corrigida.pdf
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