Fertilizantes desempenham um papel crítico na segurança alimentar global e, atualmente, enfrentam uma reestruturação profunda. Primeiramente, este artigo explora como fatores geopolíticos, variações de preços e dependência brasileira moldam o mercado de fertilizantes. Além disso, apresentamos estratégias práticas para mitigar riscos e aproveitar oportunidades.

Geopolítica dos Fertilizantes: Um Novo Tabuleiro de Jogo

Em contrapartida às dinâmicas tradicionais de oferta e demanda, os fertilizantes tornaram-se peças-chave de uma disputa geopolítica. A Rússia, por exemplo, manteve e até ampliou sua participação no fornecimento de N, P e K, redirecionando volumes para mercados como Brasil e Índia. Dessa forma, esse movimento impacta não apenas preços, mas também a segurança de abastecimento para grandes produtores agrícolas.

Sanções e Realinhamentos Comerciais

Além disso, sanções ocidentais levaram a Rússia a pivotar de amônia para ureia com maior valor agregado. Consequentemente, enquanto a exportação de amônia caiu drasticamente, a de ureia cresceu mais de 30%, transformando um entrave logístico em vantagem competitiva.

Blocos Econômicos e Fragmentação de Mercados

Contudo, a proposta de tarifas secundárias da OTAN contra países do BRICS poderia bifurcar o mercado global de fertilizantes, criando ambientes “oeste” e “BRICS-Rússia”. Nesse meio tempo, agricultores em regiões sem acesso ao fornecimento mais barato enfrentariam custos muito mais altos.

A Importância da Rússia para o Mercado Global de Fertilizantes

A Rússia figura como um dos maiores exportadores mundiais de nitrogênio, fósforo e potássio, respondendo por aproximadamente 20% das exportações globais de potássio e 15% de nitrogenados. Essa posição estratégica torna o país fundamental para a segurança alimentar global, pois suas produções abastecem grandes mercados agrícolas na Ásia, América do Norte e América Latina.

A proposta de taxar os países do BRICS que mantêm relações comerciais com a Rússia representa uma escalada significativa na guerra econômica, movendo-se para o território das sanções secundárias. A análise de tal cenário pode ser estruturada em torno de várias questões-chave:

  • Legalidade e Precedente: A imposição das tarifas secundárias enfrentaria desafios significativos no âmbito do direito comercial internacional, incluindo as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).
  • Impacto Econômico: O efeito imediato seria a criação de um mercado global de fertilizantes de dois níveis ou bifurcado. Haveria um mercado “alinhado ao Ocidente”, com preços muito mais elevados devido à exclusão dos fornecedores mais eficientes e à necessidade de obter produtos de fontes alternativas mais caras. E haveria um mercado “BRICS-Rússia”, com preços mais baixos, mas com acesso restrito aos mercados ocidentais.
  • Reação e Retaliação: É altamente improvável que as nações do BRICS visadas, especificamente Brasil, Índia e China, aceitassem passivamente tais medidas. A reação mais provável seria a retaliação, com a imposição de tarifas sobre bens e serviços ocidentais em setores onde as economias ocidentais são vulneráveis.
  • Implicações Estratégicas: Uma medida tão agressiva aceleraria drasticamente as tendências já em curso para o desenvolvimento de sistemas econômicos paralelos e mecanismos de liquidação comercial não baseados no dólar americano dentro do bloco BRICS e das nações aliadas. Solidificaria a fragmentação geopolítica da economia global.

Tabela 1: Evolução da Participação de Mercado Global da Rússia em Fertilizantes (2021 vs. 2024)

Categoria de FertilizanteParticipação de Mercado Global 2021 (%)Participação de Mercado Global 2024 (%)Variação (Pontos Percentuais)
Potássio (MOP)1825+7
Ureia1216+4
Fosfatados (DAP/MAP)1417+3
Nitratos2721-6
Amônia244-20

Fonte: Elaborado com base nos dados do relatório da FAO, Food Outlook, junho de 2025.

Relação Comercial Rússia-Brasil

O Brasil, por sua vez, é o principal destino das exportações russas de fertilizantes na América Latina, importando quase 40% de seu potássio e 25% de ureia da Rússia. A parceria se fortaleceu nos últimos anos com acordos bilaterais de longo prazo, que incluem operações de barter, trocas de fertilizantes por grãos, além de iniciativas logísticas que reduzem custos de transporte via portos do Mar Negro e rotas férreas. Atualmente, empresas russas como PhosAgro e Uralkali mantêm escritórios no Brasil e participam de feiras agrícolas, reforçando a cooperação tecnológica e comercial entre os dois países.

Preços dos Fertilizantes e Seus Impactos na Produção

Em primeiro lugar, a volatilidade de preços atingiu patamares históricos em abril de 2022, quando uma cesta média de nutrientes chegou a US$ 815/t. Entretanto, em 2024, o valor recuou para cerca de US$ 336/t, ainda sem estabilidade.

Na figura 2, pode-se observar a composição de uma cesta de produtos, nitrogenados, potássicos e fosfatados e o index de fertilizantes.

Figura 2. Preços Nitrogênio, Fosforo e Potássio, 2020 a 2025.

Fatores que Influenciam o Custo do Nitrogênio

De fato, os preços de nitrogenados estão atrelados ao custo do gás natural. Assim sendo, flutuações no mercado energético têm reflexos imediatos na rentabilidade das lavouras.

Causas da Volatilidade em Fosfatados e Potássio

Por outro lado, fosfatados respondem tanto a políticas de exportação, especialmente da China, quanto aos custos de energia. Similarmente, o potássio, produto de mineração, varia conforme a oferta e demanda global, mas sem forte correlação com o mercado de energia.

Dependência de Fertilizantes no Brasil: Riscos e Consequências

Primordialmente, o Brasil importa mais de 70% dos fertilizantes que consome. Logo, a concentração em um único fornecedor, como a Rússia, aumenta a vulnerabilidade do agronegócio nacional. Aliás, a participação russa nas importações brasileiras de potássio saltou de 27% para 38% entre 2021 e 2024.

Impacto nas Principais Commodities

Além disso, culturas como soja, milho e cana-de-açúcar dependem diretamente desses insumos. Portanto, variações de preços e possíveis restrições de oferta podem reduzir margens e comprometer planejamentos financeiros.

Alternativas para Diversificar Fontes

Contudo, é possível mitigar riscos por meio da diversificação de fornecedores e da adoção de práticas de agricultura de precisão, que reduzem a necessidade de aplicação excessiva de fertilizantes.

Conclusão

O mercado de fertilizantes passou por uma metamorfose. A mudança não é cíclica nem temporária; é uma reestruturação fundamental e, muito provavelmente, irrevogável. A era de um mercado global singular e integrado, governado principalmente por forças econômicas, deu lugar a uma paisagem fragmentada, politizada e dividida em blocos. A Rússia, longe de ser isolada, adaptou-se com sucesso a esta nova realidade, pivotando a sua cadeia de valor e consolidando a sua influência em novos centros de demanda, como o Brasil. Os preços dos nutrientes dissociaram-se, cada um respondendo à sua própria lógica distinta. O sucesso e a estabilidade nesta nova era, seja para uma empresa agrícola, um investidor ou um governo, dependerão de uma compreensão profunda e de uma navegação ágil por estas novas e complexas linhas de falha geopolíticas e econômicas.

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