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Em um cenário de escassez de alimentos e de insumos agrícolas – como os biofertilizantes – cada vez mais caros, o uso adequado destes pode resultar em ganhos de produtividade, e, consequentemente, de rentabilidade das lavouras. No entanto, para que isso possa ser feito corretamente, é necessário ter informações assertivas e cientificamente comprovadas sobre estes produtos, para então aplicá-los corretamente. Leia o artigo a seguir para saber mais sobre esse assunto tão discutido ultimamente.
Introdução
A soja (Glycine max L. Merril) é a principal commodity agrícola do país, com considerável importância na produção de grãos e na exportação (KLAHOLD, 2006). Na safra 2021/22, o Brasil plantou aproximadamente 40,58 milhões de hectares desta cultura, valor 3,5% maior em relação à safra passada, no entanto, a produtividade e a produção sofreram uma queda considerável com relação ao ano passado, de -12,3% e -9,2%, respectivamente, o que pode estar relacionado com diversos fatores, dentre eles, adversidades climáticas, como o déficit hídrico e altas temperaturas (CONAB, 2022).
Ademais, a procura pelo incremento da produtividade das lavouras é algo imprescindível aos agricultores, visto que os insumos necessários estão cada vez mais caros, o que os força a tornar a produção cada vez mais eficiente e rentável.
Nesse sentido, os avanços tecnológicos na agricultura já proporcionaram incremento considerável na produtividade de diversas culturas, no entanto, devido ao grande potencial genético de produtividade da soja, sabe-se que a busca por novas tecnologias deve ser constante, abrangendo as mais diversas áreas do conhecimento, e, ultimamente, a classe dos biofertilizantes é um assunto bastante discutido, sendo de suma importância o seu estudo e o embasamento teórico e científico.
Biofertilizantes
Os biofertilizantes são produtos compostos com base biológica, sejam componentes ativos ou agentes biológicos, que atuam de maneira direta ou indireta sobre um sistema de cultivo de plantas, a fim de favorecer processos fisiológicos/metabólicos em diferentes condições de campo (MAPA, 2021).
A composição destes produtos pode variar quanto ao teor de nutrientes e consequente atuação nas plantas, mas – devido a isso – a época de aplicação e dosagem podem afetar diretamente o resultado dos ensaios e o manejo final adotado pelo produtor (SILVA et al, 2008).
Desta forma, a inserção destes biofertilizantes no manejo da cultura da soja no Brasil pode favorecer o cultivo da mesma no país, possibilitando melhor desenvolvimento e maior relevância da cultura, aumentando a rentabilidade desta (ARAÚJO et al., 2021).
Tendo em vista a importância dos insumos citados para o estabelecimento de manejos e sistemas de cultivo, o Ministério da Agricultura, Pesquisa e Abastecimento estabeleceu – em julho de 2020 – uma nova legislação que define os diferentes tipos de biofertilizantes.
Os extratos de alga são um dos tipos de biofertilizantes mais utilizados atualmente e podem atuar como agentes antiestresse, favorecendo a fisiologia das plantas mesmo em condições adversas, como déficit hídrico (ZHANG; ERVIN, 2003). Segundo os autores, tal favorecimento pode se dar através da indução à síntese de fitormônios de crescimento e à presença de nutrientes em sua composição.
Os aminoácidos também podem ser utilizados na agricultura a fim de favorecer o sistema produtivo e propiciar às plantas, melhores condições para o desenvolvimento. Além de beneficiar a sobrevivência das plantas em condições de estresse hídrico, por exemplo, através da moderação da regulação estomática, tal tipo de biofertilizantes pode atuar na estabilização do mecanismo antioxidante da planta, diminuindo a atividade das espécies reativas de oxigênio (ERO’s) (NASHOLM et al., 2009).
A decomposição de compostos orgânicos possibilita a formação de substâncias que, quando utilizadas na agricultura, favorecem o desempenho das plantas cultivadas e – desta forma – o aumento da produtividade. Os ácidos húmicos e fúlvicos são originados de tal processo de decomposição e diferenciam-se quanto à solubilidade em água, sendo os primeiros menos solúveis. Castro et al. (2019) afirmam que as substâncias em questão podem beneficiar a regulação enzimática das plantas, além de processos como a fotossíntese e a respiração aeróbica. Quando aplicados no solo, tais ácidos atuam na estruturação do mesmo através da formação de agregados.
Os hormônios vegetais, ou fitormônios, podem ser classificados como biofertilizantes, uma vez que atuam no metabolismo das plantas e podem favorecer o desenvolvimento vegetativo e reprodutivo, além de auxiliar fisiologicamente na redução dos efeitos maléficos causados por condições adversas. Melo (2002) afirma que as auxinas, giberelinas e citocininas são os principais hormônios que atuam no desenvolvimento da parte aérea e das raízes das plantas, beneficiando a absorção de CO2, água e nutrientes. Além disso, o autor considera outros fitormônios essenciais para a atuação como biofertilizante, situação em que se encontra o etileno, responsável pela floração e pela maturação dos frutos, e o ácido abiscísico, que atua na regulação estomática, reduzindo as perdas de água.
Cultura da soja
A cultura da soja, no Brasil, é um dos carros-chefes da economia, favorecendo diversas atividades como a alimentação animal e humana. O cultivo da soja no país, em 2020, possibilitou a produção de mais de 130 milhões de toneladas de grãos, representando cerca de 38% da produção mundial de soja (CONAB, 2021). A produtividade média da soja no Brasil, em 2020, foi de 60 sc ha-1, enquanto a média mundial atingiu 50 sc ha-1.
A importância da cultura está atrelada ao consumo animal, principalmente de bovinos, e ao consumo humano de óleos, como o óleo de soja – essencial para a confecção de alimentos no cotidiano (CÂMARA, [s.d.]).
A soja, por ser diretamente afetada pelo fotoperíodo, sofre diretamente com a alteração do clima e os aspectos edafoclimáticos do local onde é cultivada, como o clima, temperatura e características do solo (SEDIYAMA, 2015). Desta forma, torna-se essencial o planejamento de safra e desenvolvimento de técnicas que favoreçam a continuidade da cultura e possibilitem altas produtividades, através da construção do perfil do solo, elaboração de manejos sustentáveis e utilização de novas tecnologias que integrem a produção agrícola e o meio-ambiente (SEDIYAMA, 2015).
Desta forma, Bertolin et al. (2010) afirmam que a utilização de biofertilizantes na soja podem auxiliar na mitigação de estresses e no melhor desenvolvimento da cultura, favorecendo a integração entre o ambiente e a produção agrícola mundial.
Manejo de bioestimulantes na cultura da soja
A fim de elaborar diversos manejos do uso de biofertilizantes na cultura da soja, muitos ensaios experimentais abordaram a utilização dos mesmos na leguminosa em questão, estudando desde a aplicação de hormônios vegetais até extratos de alga. Além do insumo utilizado, é válido ressaltar que a época de aplicação dos mesmos afeta diretamente a resposta da cultura ao insumo, sendo constatado por Bertolin et al. (2010) que maiores produtividades são atingidas em manejos onde a aplicação ocorre no início da fase reprodutiva. O mesmo autor conclui em seu ensaio experimental que a aplicação via foliar de um biofertilizante composto por hormônios de crescimento, como ácido giberélico e o indolbutírico, beneficia o desenvolvimento das plantas, proporcionando aumento na produtividade da soja.
Araújo et al. (2021) realizaram um ensaio avaliando a aplicação de diversos biofertilizantes comerciais em diferentes cultivares de soja. O objetivo do experimento era avaliar a resposta da cultura a diferentes biofertilizantes, sendo um deles composto por ácido indolbutírico e ácido giberélico, outro composto por ácido giberélico e, por fim, um biofertilizante composto por extratos vegetais hidrolisados. Ao final do experimento, os autores concluíram que a aplicação foliar no início do florescimento de cultivares com hábito de crescimento determinado beneficiou o desenvolvimento e a fisiologia das plantas, possibilitando o aumento de até 20 sc ha-1 em relação ao controle.
Otto et al. (2021) avaliaram a resposta da soja a diferentes biofertilizantes em condições de campo. O experimento foi composto por aplicações de insumos baseados em aminoácidos, extratos vegetais e reguladores de crescimento, em diversos estádios fenológicos da cultura (V3/V4, V3/V4 + 15 dias, R1 e R1 + 15 dias). Os autores concluíram que a resposta da soja ao uso de biofertilizantes foi variável, não resultando em diferenças estatísticas de produtividade e biométricas nas condições de campo do respectivo ensaio.
A aplicação de biofertilizantes em R1, início do florescimento, também demonstrou ganhos de produtividade em um experimento realizado por Meyer et al. (2021). Os autores constataram que a aplicação foliar de extrato de Ecklonia maxima, espécie de alga marinha, possibilitou o aumento do número de flores, nós e vagens nas plantas, consequentemente, favorecendo o aumento da produtividade da cultura. Tais características podem ser relacionadas à presença de auxinas na composição do extrato de alga utilizado no experimento, que favorece o desenvolvimento vegetativo das plantas e – desta forma – possibilita maior formação de nós e maior altura das plantas.
Portanto, através dos experimentos analisados e de outros ensaios realizados abordando a resposta da soja à aplicação de bioestimulantes, é válido ressaltar que a aplicação foliar ou no tratamento de sementes pode favorecer o desenvolvimento das plantas em condições contrárias ao seu ciclo, principalmente quando estabelecida em estádios fenológicos assertivos, como em V4 ou no início de seu florescimento. Além disso, pode-se observar que, apesar de não ser tão disseminada, a utilização de biofertilizantes apresenta potencial de substituir – em partes – práticas tradicionais da agricultura, favorecendo a maior integridade dos ecossistemas onde o cultivo agrícola está inserido.
Conclusão
O uso de biofertilizantes tem se tornado cada vez mais comum no Brasil e é um nicho de mercado bastante atrativo e com grande potencial de expansão. Estes possuem uma série de vantagens e podem favorecer os elevados tetos produtivos da soja, promovendo o crescimento da planta, equilíbrio hormonal, desenvolvimento do sistema radicular e, consequente resistência ao déficit hídrico, aumento do peso de sementes, redução do abortamento e desenvolvimento de estruturas reprodutivas.
No entanto, é importante ressaltar que deve ser feito um manejo adequado da aplicação destes na soja, como o uso da dose correta, época de aplicação e de quais produtos serão aplicados, visto que a cultivar de soja e as condições edafoclimáticas e ambientais do local a ser cultivado irão interferir diretamente na eficiência do uso destes produtos e, consequentemente, na produtividade da oleaginosa.
Sendo assim, é fundamental que sejam feitos novos estudos e pesquisas que validem a eficiência e a rentabilidade da aplicação de biofertilizantes na soja, visto que, por se tratar de um mercado relativamente recente, em muitos casos, a falta de fiscalização e de um controle de qualidade efetivo resultam na venda de produtos comerciais sem embasamento científico, lesando os produtores.
Agora que você já conhece algumas informações importantes acerca do uso de biofertilizantes na cultura da soja, pode-se realizar um manejo mais adequado, o que certamente impactará na produtividade da mesma.
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Referências Bibliográficas
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